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Conservadorismo e Psicanálise

  • Foto do escritor: Nathan Barbosa
    Nathan Barbosa
  • 12 de out. de 2014
  • 4 min de leitura

Nobel da paz para Martin Luther King e da literatura para Sartre; primeiro livro do J. Lenon; nascimento de João Gordo, Alexandre Frota e Michele Obama. Não bastasse esses fenomenais fatídicos sociais, 1964 estava inabalável e só parou quando conseguiu a deposição de João Goulart, só cessou quando alocou Castello Branco para dar início aos anos vermelhos, não o mesmo vermelho de um possível comunismo prestes a se instaurar, mas sim a vermelhidão do sangue, do tapa e da vergonha que os países sobreviventes da ditadura sentem até hoje. Longe de acusar uma correlação positiva, a falta de democracia inaugurou uma onda de conservadorismo jamais vista... até hoje. Ao que parece, a evolução política brasileira tem validade, e ela data 50 anos.


O que a progressão do conservadorismo reserva à Psicanálise?


A resistência à prática psicanalítica dificilmente será uma raridade na civilização. Já em suas primeiras conferências, Freud viu uma plateia que gargalhou, contestou e se vendou durante muitos anos para repudiar a existência de um complexo de édipo ou uma sexualidade infantil. Tais objeções, à época, eram facilmente digeríveis, pois tratava-se de um final do século 19 que assentava o suprassumo da moralidade, século este que dava seus primeiros passos rumo às grandes conquistas como abolição da escravatura e a primeira revolução industrial.

Os médicos, que ora se apropriavam apenas da biologia e fisiologia do corpo humano, não cogitavam em seu aporte científico um psiquismo, digamos, abstrato, e a filosofia, com toda a sua abstração, também não alocava algo além do consciente, portanto, a inconsciência era incompatível com seus conhecimentos.


Falar de algo que foi propositalmente esquecido na infância para precaver o incompreensível desejo pelo incesto, e com isso deflagrar a ativa sexualidade nas crianças pequenas, levou Freud a afirmar que "as poderosas resistências à psicanálise não eram de natureza intelectual, portanto, e se originavam de fontes afetivas" (1925/2011, p. 264), com isso os homens se voltaram contra a psicanálise com receio da descoberta de sua amnésia infantil, e assim é até hoje. Algo que lhes infringe enormemente não pela via da apreensão, mas sim por enterrar séculos de restrições que estão, a primeira vista, muito bem equilibradas. A culpa existe, mas é velada. O desejo é suprimido, mas sua renúncia traz à luz uma compensação desconhecida, e que sem suporte, causa angústia. Ao falar da angústia, Lacan diz que há objeto. Este é o objeto a, aquele que


traz a iminência do seio materno. [...] O que provoca a angústia é tudo aquilo que nos anuncia, que nos permite entrever que voltaremos ao colo. [...] O que há de mais angustiante para a criança é, justamente, quando a relação com base na qual essa possibilidade se institui, pela falta que a transforma em desejo, é perturbada (O seminário, livro 10: a angústia, p. 64).


Seria o saber psicanalítico uma ação que questiona o lugar de desejo do ser humano, a tal ponto que não sabê-lo é um meio de suplantar a falta?! Afinal, nosso pragmatismo contorna o fomento do desejo, e este só é alcançado quando essas amarras são quebradas, lê-se quando o saber psicanalítico é praticado.


A correlação entre um país conservador e a práxis psicanalítica parece óbvia, tão clara quanto dizer que isso, decerto, criará empecilhos à clínica e ao âmbito social, mas não devo cair na ilusão do conhecimento alheio.

A psicanálise sempre será hostil para a sociedade, enquanto esta não discutir os impulsos e supressões sexuais. Antes que se tenha má consciência da teoria, Freud (1925/2011, p. 262) se adiantou para dizer que "a psicanálise jamais se pronunciou a favor da liberação dos instintos socialmente perniciosos; pelo contrário, advertiu e recomendou melhoras.". Tais melhorias advêm de métodos diferentes aos adotados pelo atual sistema, que suprimem grande parte dos impulsos à satisfação. Portanto, diz Freud (1925/2011, p. 263) que "ela propõe que se reduza a severidade da repressão instintual e que se dê mais ênfase à veracidade [...] um procedimento melhor e mais seguro".


A bancada parlamentar não define uma sociedade conservadora. Pelo contrário, é a sociedade conservadora que define uma bancada parlamentar igualmente conservadora. Sendo assim, jamais será um embate entre o parlamento e a psicanálise, mas sim entre a psicanálise e a sociedade conservadora. No entanto, com parlamentares majoritariamente inertes à essa discussão, o ato psicanalítico torna-se mais árduo, pois agora a discussão não está apenas no plano da opinião, mas na elaboração de leis, uma estrutura bem mais difícil de retificar que uma mera opinião. Custa à comunidade psicanalítica ver seus simpáticos contribuírem para tal engenho.


Situando-os a algo mais prático, a historiadora e psicanalista Elisabeth Roudinesco veio ao Rio de Janeiro no dia 06/10/2014 para falar sobre a contemporaneidade da teoria. Entre muitos construtos, exaltou uma comunidade francesa mais conservadora, composta também por um parlamento conservador fruto dos anos da crise do euro. Simples, resumiu este fato como sendo um dos principais métodos repressivos à psicanálise, principalmente quando esta se faz limítrofe à religião. Como a bancada conservadora brasileira é composta principalmente por religiosos, temos, então, uma dimensão do quão laborioso será sustentar o nosso desejo de viver psicanálise.


Em tempo, a luta em favor do desejo continua, sendo este a principal obscuridade da sociedade conservadora, de combate, inclusive, aos que extraem da psicanálise algo deformado de sua teoria. Foi o caso de alguns psicanalistas devidamente refutados no texto sobre A sociedade que acomete as diferenças sexuais, bem como é o caso de um colunista da Veja chamado Rodrigo Constantino que viu em Freud o seu escape para fundamentar o conservadorismo liberal que, segundo seu slogan, é "sem medo de polêmica". risos. Ele ficou feliz de ver que Freud não era progressista, mas sim um conservador rebelde, atribuindo a descrença de Freud no Marxismo ao seu negativo: o conservadorismo, com pitadas de fascismo. Sem considerar que na mesma entrevista, do qual ele só pega a resposta que lhe convém, Elisabeth exalta que deve-se ser contra o dogmatismo da psicanálise, Rodrigo apela à um conservadorismo em plena época de eleição, em plena Veja pró-direita, pró-conservadorismo.


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