top of page

Sociedade que acomete as diferenças sexuais

  • Foto do escritor: Nathan Barbosa
    Nathan Barbosa
  • 29 de set. de 2014
  • 3 min de leitura


Traumatismo craniano, lesão no tórax, no estômago e ferimentos diversos. Esse é o novo quadro sintomático de um sujeito acometido por uma doença de causas externas: a intolerância da sociedade. Tal como uma infecção, um parasita ou uma bactéria, ela se alastra facilmente de organismo a organismo, mas dessa vez seu combate não é a nível biológico, mas sim psíquico. Dessa vez são pessoas e não seres unicelulares e microscópicos.

Sua direção de tratamento? Conhecimento.


O que a psicanálise diz sobre a bissexualidade psíquica e o prazer sexual?


Considere o término desta leitura um sucesso de sua segurança sexual. Muitos sequer a terminarão, e como provação, aviso: a psicanálise aponta que um sujeito sexualmente resolvido usufrui de ambos os objetos, ou seja, quando ele é bissexual. Outro quesito para terminar este texto sem cair no engessamento moral, é admitir que a humanidade não é mais animal, instintiva e apenas reprodutiva, tais como foram os argumentos do candidato à presidência Levy Fidélix no debate da TV Record (28/09/2014). A humanidade entrou em uma instância que nenhum outro ser vivo desfruta, e por isso mudou toda a dinâmica das relações sexuais. Tal instância se chama linguagem.


Ao ressaltar que a criança nasce com sua inscrição na linguagem, Lacan (1953/1998) salienta que a idealização é feita antes mesmo do seu nascimento. É o Outro, enquanto função materna, que prefere um gênero, traça toda a trajetória profissional, gostos, preferências, etc., bem como é este mesmo Outro, enquanto cultura, que atribui uma função masculina ou feminina da criança para com a sociedade: meninos com videogames e meninas com bonecas. No entanto, diz Quinet (2013, p. 91), nem a linguagem, nem a inscrição da cultura, muito menos sua anatomia, garantirão ao sujeito uma escolha objetal pré-determinada, pois elas não delimitam prazer sexual, a medida que esta é determinada pela pulsão. Sendo assim, o real do corpo, digo, aquele rol de signos que, fora da linguagem, definem a posição sexual do animal, se descaracterizam no conceito pulsional da humanidade, demonstrando que "ser homem ou ser mulher é uma escolha de gozo" e não uma ordem imposta pelo corpo (Quinet, 2013, p. 91). Por este motivo, a psicanálise alça o sujeito do desejo para dizer que não é uma regra a relação do casal homossexual gerar filhos homossexuais. Tal explicação se afirma, não obstante, através do atual modelo histórico: casal hétero gerando filhos homossexuais. Isso apreende, mas não se limita, a eliminar o engano de que uma nova formação familiar de casais homossexuais, irá retificar a existência heterossexual na família. Outro fator que rotineiramente é via de debate por parte dos preocupados com a homossexualidade, é a identificação do gênero enquanto posição passiva para mulher e ativa para o homem, tida esta como uma regra da contemporaneidade herdada do pensamento patriarcal de séculos passados. Não raro vemos serem inclusos na homossexualidade sujeitos que, aos olhos da preocupação, não condizem com seu órgão genital. Nem mesmo os psicanalistas se salvam, basta ler Waldemar Zusman, que diz:


todo homossexual tem uma identidade sexual (de gênero) que está em desacordo com os seus órgãos sexuais, do ponto de vista anatômico e fisiológico. Não se trata de um problema hormonal ou genético e sim de identificação (Apud Marco Antonio, 2013, p. 23)


No entanto, já havia escrito Freud (1920, p. 210), que um homem com qualidades viris pode rogar na relação amorosa a igualdade de gênero, ou seja, ter como objeto outro homem. Ao mesmo passo, mulheres com características masculinas podem assumir no objeto oposto a sua escolha, demonstrando que "caráter sexual e escolha de objeto [não] coincidem numa relação fixa". Para ele, haveriam três fatores preponderantes: o fisiológico, enquanto órgão genital; o da posição passiva ou ativa, o que também não define a homossexualidade; e, por fim, a escolha do objeto mesmo ou oposto, essa sim de ato sexual. Essa explicação se torna, portanto, um motivo acadêmico, além do já satisfatório senso comum que se pauta no abomínio do preconceito, para se desprender do estigma que arremata a posição ativa ou passiva à escolha do objeto de desejo, sem levar em consideração que o exemplo vívido da característica masculina pode ser gay e homem, ao passo que o exemplo vívido das características femininas pode ser hétero e também homem. Obviamente, este disposto não alcança toda a teoria psicanalítica sobre a bissexualidade originária de todo ser, findada no complexo de Édipo através da identificação - não a supracitada como errônea - e escolha objetal. Por isso, indico o fenomenal livro chamado As homossexualidades na psicanálise na história de sua despatologização, livro do qual me pautei unicamente para escrever este lacônico, mas esclarecedor de argumentos levyanos - em referência ao querido Levy - que a sociedade emite.


Comments


© 2023 by BI World. Proudly created with Wix.com

bottom of page